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Editorial

Em breve.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Lênin 90 anos depois

"Lênin em frente ao Instituto Smolny", quadro de Isaac Brodski

Há 90 anos atrás, em 21 de janeiro de 1924, faleceu em Gorki, na então União das Repúblicas Socialistas Soviética (URSS), Vladimir Ilyich Ulyanov, mais conhecido como Lênin, Presidente do Conselho de Comissários do Povo da União Soviética (cargo equivalente ao de Primeiro-Ministro), líder e pai da Revolução Russa, um dos mais importantes movimentos – para alguns o mais importante – do século XX. Revolucionário, advogado, escritor, filósofo e polemista foram alguns dos epítetos dados a este homem taciturno, mas dotado de uma grande energia mental e uma vontade inquebrantável que foram dedicadas à causa da Revolução Socialista até o fim de seus dias.
Para aqueles que não conhecem ou que não se lembram, nos parágrafos seguintes há um breve resumo da vida de Lênin.

Lênin com 17 anos de idade
                                             
Lênin nasceu em 22 de abril de 1870 em Simbirsk, no antigo Império Russo, filho de Ilia Nikolayevich Ulianov, um alto funcionário do governo e  Maria Alexandrovna Ulyanova, uma professora.  Era o quarto filho entre seis irmãos, dentre estes estavam Anna e Alexander, ambos muito engajados politicamente. Em 1887, seu irmão foi enforcado por participar de uma conjura para matar o então Czar Alexander III. Essa execução de seu irmão marcou o início da radicalização política do jovem Vladimir. Nesse mesmo ano, entrou para a Universidade de Kazan para estudar Direito. Lá teve seu primeiro contato com as obras de Karl Marx e Friedrich Engels e foi preso pela primeira vez ao participar de uma manifestação estudantil. Após ser libertado passou a ser vigiado constante pela polícia, afinal, era um “irmão de um terrorista”. Em 1890, foi para a Universidade de São Petersburgo e lá destacou-se brilhantemente em línguas clássicas (latim e grego) e modernas (alemão, francês e inglês).
Após terminar o curso, advogou por algum tempo. Em 1893, mudou-se para São Petersburgo e, lá, começou a divulgar ideias revolucionárias até ser preso, em 1895, e exilado para a Sibéria dois anos depois. Em 1898, casou-se com a filha de um oficial do exército russo e militante socialista Nadežda Konstantinovna Krupskaja. Durante o exílio siberiano escreveu muito e, em 1899, publicou o livro O Desenvolvimento do Capitalismo na Rússia.
Assim que o seu exílio na Sibéria terminou, em 1900, Lênin saiu da Rússia e, durante cinco anos viveu fora do país indo primeiro para Munique, depois para Londres e, finalmente, Genebra. Nesse intervalo de tempo, adotou definitivamente a alcunha de Lênin (derivado de Lena, nome de um rio siberiano), fundou o jornal Iskra (“faísca”, em russo), publicou o livro Que fazer? no qual, entre outros assuntos, critica a ala Menchevique (“minoria”), do Partido Operário Social-Democrata Russo (POSDR), que defende uma aliança entre a classes trabalhadora e a burguesia e liberal para derrubar o regime czarista ao invés de uma aliança operário-camponesa defendida pela ala Bolchevique (“maioria”).

Lênin com Trotsky (à direita, a fazer continência), em 1919
                  
É também neste período que tomou contato com duas pessoas que fariam história mundialmente: Leon Trotsky (em 1902) e Josef Stalin (1903).
Ao retornar à Rússia, em 1905, participou da Revolução ocorrida nesse mesmo ano. Foi uma época na qual ocorreram diversas revoltas de operários, camponeses, marinheiros e soldados. Pressionado, o então Czar Nicolau II fez algumas reformas, dentre as quais a criação de uma Duma (parlamento) e de partidos políticos, dos quais destacavam-se o Partido Menchevique e o Partido Bolchevique, de Lênin. Porém, o Czar voltou atrás em sua decisão e apenas a Duma continuou a funcionar de modo precário. Mais tarde, Lênin dia que a Revolução de 1905 serviu de ensaio para a Revolução de 1917 e de lição para os revolucionários, para que estes avaliassem seus erros e não voltassem a cometê-los.
Em 1906, Lênin foi eleito líder do POSDR, mas, no seguinte, retorna para o exílio na Europa Ocidental e lá ficaria até 1917. Durante esse tempo, escreveu e publicou mais livros e desenvolveu sua teoria política.
Em 1914, eclodiu a I Guerra Mundial (que será um assunto a ser tratado em Panorama BR mais à frente) e Lênin se opôs à entrada da Rússia no conflito por entender que os operários e camponeses estavam lutando em uma guerra imperialista da burguesia. No início da guerra, chegou a ser preso por tropas austríacas em uma pequena vila na Polônia onde residia. Logo foi libertado e, em seguida, mudou-se para a Suíça, primeiro para Berna e, depois, para Zurique.
A guerra foi um desastre para a Rússia. Cerca de dois milhões de soldados morreram, mais dois milhões foram feitos prisioneiros e um milhão estavam desaparecidos. As tropas estavam sem comida, botas, munições e armas. A escassez de alimentos gerou tumultos em Petrogrado (atual São Petersburgo), então capital do país. Quando o abastecimento de alimentos e combustíveis parou, a situação ficou insustentável e o Czar foi obrigado a abdicar em fevereiro de 1917. Foi formado um governo provisório liderado pelo jovem advogado socialista Alexander Kerensky. Embora, teoricamente, o governo provisório fosse o oficial, na prática, dividia o poder com o Soviete (associação de trabalhadores que era regido por autogestão) de Petrogrado.
As notícias da queda da monarquia deixaram Lênin atônito. Quando o governo provisório, contrariando as expectativas, disse que não retiraria a Rússia da guerra, Lênin viu que era hora de voltar e tomar as rédeas da situação. Após uma longa viagem de trem, chegou, em abril de 1917, à Estação Finlândia, em Petrogrado. Durante o trajeto escreveu as Teses de Abril, o programa para o Partido Bolchevique e ao desembarcar proferiu a famosa frase: “Não precisamos de uma revolução burguesa. Todo poder aos Sovietes!”.

Alexander Kerensky, líder do governo provisório

O governo provisório sentiu o golpe e mandou prender os bolcheviques. Lênin fugiu para a Finlândia em julho e, de lá, comandava a Revolução. Os tumultos continuavam e a situação do governo liderado por Kerensky se deteriorava cada vez mais. Em outubro, Lênin retornou da Finlândia e do Instituto Smolny – um antigo colégio para moças – liderou a deposição do governo provisório, a invasão e tomada do Palácio de Inverno, sede do governo, a rendição de Kerensky e estabeleceu o governo bolchevique na Rússia. “Agora, vamos passar à construção da ordem socialista”, disse em outra famosa frase.
A construção começou com a retirada da Rússia da guerra, no início de 1918, seguindo-se a instituição do sistema de saúde e educação universal e gratuita para todo o povo, distribuição de terras aos camponeses e direitos políticos e civis para as mulheres. Essas medidas eram simplesmente impensáveis durante o período czarista. A economia começou a ser reorganizada para recuperar-se dos estragos advindos da guerra.
Porém, se a retirada da guerra foi uma promessa feita ao povo russo que os bolcheviques cumpriram ao assumir o poder, essa atitude não agradou aos aliados da Rússia no conflito, pois o país retirou-se sem consultar os outros. Devido a isso e à natureza socialista da Revolução, vários países estrangeiros apoiaram os anti-bolcheviques e os ajudaram a criar o Exército Branco. Era o início da Guerra Civil, que duraria mais quatro longos anos.
A resposta bolchevique veio rápida: foi criado e organizado em tempo recorde, sob a direção de Trotsky, o Exército Vermelho. Também foi criada uma polícia secreta, a Tcheka, para “combater atividades anti-revolucionárias”. Para manter as tropas alimentadas e evitar o colapso econômico, foi criado o Comunismo de Guerra. Por sugestão de Stalin, foi instituído o polêmico Terror Vermelho, período no qual ocorreram muitas prisões e execuções.
Com a vitória dos bolcheviques, o Comunismo de Guerra foi substituído pela Nova Política Econômica (NEP), que reconstruiu com sucesso a indústria e a agricultura. Depois de tanta luta, parecia que finalmente a ordem socialista seria construída em paz.
Entretanto, após a vitória, Lênin sofreria três derrames cerebrais entre 1922 e 1923, decorrentes de uma saúde debilitada devido ao excesso de trabalho. Os derrames o deixaram com o lado direito do corpo paralisado e sua saúde decaía cada vez mais até finalmente falecer em 21 de janeiro de 1924.
Aí temos Lênin, a figura histórica, mas quem era Lênin, o homem?
Nas palavras do jornalista estadunidense John Reed, autor do livro Os Dez Dias Que Abalaram o Mundo, no qual relata, no calor da hora, a Revolução Socialista Russa, Lênin era "Uma figura, baixa e atarracada, com uma grande cabeça estabelecida em seus ombros, calvo e saliente. Olhos pequenos, boca larga e queixo pesado, bem barbeado agora, mas já começam a ofender com a barba bem conhecida de seu passado e futuro. Vestido com roupas surradas, calças demasiadamente longas para ele. Inexpressivo, para ser o ídolo de uma multidão, amado e reverenciado como talvez poucos líderes na história podem ter sido. Um estranho líder popular — um líder exclusivamente em virtude do intelecto; incolor, sem humor, intransigente e individual, sem pitorescas peculiaridades, mas com o poder de explicar ideias profundas em termos simples, de analisar uma situação concreta. E combinado com astúcia, a maior audácia intelectual."[1]

Lênin ao ser entrevistado por H.G. Wells, em 1920

Já o escrito britânico H. G. Wells, autor de vários romances de sucesso tais como A Máquina do Tempo, A Guerra dos Mundos, A Ilha do Dr. Moreau e O Homem Invisível, que realizou uma entrevista com Lênin em 1920, assim descreveu o líder revolucionário russo: “Encontramos finalmente Lênin, uma pequena figura em uma grande mesa, numa sala bem iluminada com magnífica vista. Achei sua escrivaninha um tanto bagunçada. Sentei-me a um canto da mesa, e o homenzinho – seu pé mal tocava o chão quando ele se sentou na ponta da cadeira – virou-se para conversar comigo, colocando os braços ao redor e sobre uma pilha de papéis. Ele falava um inglês excelente (...). Eu tinha vindo com a expectativa de discutir com um marxista doutrinário (Wells era um Socialista Utópico – nota do autor). Não encontrei nada parecido. Tinha ouvido falar que Lênin gostava de dar lições às pessoas; ele certamente não o fez nesta ocasião. Muito se falou de sua risada nas descrições, uma risada que poderia ser prazerosa a princípio e cínica ao final. Esta risada não apareceu. Sua testa me lembrou a de alguém – não pude lembrar quem, até que em uma outra tarde eu vi Sr. Arthur Balfour (ex-primeiro-ministro britânico) sentado e falando sob uma luz fraca. É exatamente a mesma abóbada, o crânio ligeiramente unilateral. Lênin tem uma agradável, mutável, face amorenada, com um vívido sorriso e o hábito (talvez por alguma dificuldade em enxergar) de apertar um olho quando pausa a conversação; ele não se parece muito com as fotografias que você conhece dele porque é uma dessas pessoas cuja mudança de expressão é mais importante que os rasgos; ele gesticulava um pouco com suas mãos sobre os papéis amontoados enquanto falava, e falava rapidamente, muito perspicaz sobre a sua matéria, sem nenhuma pose ou pretensão ou reserva, como um bom homem de ciências falaria”.[2]
Porém, a melhor descrição de Lênin talvez tenha sido feita pelo historiador francês Arthur Conte: SÓCRATES PROCLAMADO REI. Assim é possível resumir, com uma metáfora, a longa e taciturna vida (...). Durante 40 anos - de aproximadamente 1877, quando tinha 17 anos e tomou partido do marxismo contra os antigos regimes até 1917, quando foi chamado para dar "o último golpe" contra a dinastia dos Romanov -, sua existência se resume a uma única imagem: o homem que permanece sentado rascunhando enquanto sua companheira, Nadjeda Krupskaia, organiza fichas.

Lênin em seu escritório por volta de 1920

Aos 20 anos, Lenin já era o que seria 40 anos mais tarde: a aparência envelhecida, a silhueta magra e pequena, o paletó lustroso nos cotovelos, as botinas gastas, a cabeça grande demais para ombros tão estreitos, a fronte ossuda e os olhos mongólicos. Ele tinha crises de riso nervoso e uma voz rouca, cortando as sílabas e cindindo as frases. Sofria de uma timidez prodigiosa, que só superava por uma energia prodigiosa. (...)
Ora lembra o rato de biblioteca, gordo e de dentes afiados, que rói pacientemente a casa, ora a aranha tecendo a teia. (...) Há momentos em que lembra a formiga. (...) Uma formiga não esquece, principalmente, de acumular provisões. (...)
A revolução bolchevista, sob a luz dos ideais marxistas, foi a grande vitória desse rato, dessa aranha e dessa formiga”. [3]
Obviamente que há aqueles que o chamam de autoritário, ditador e até de assassino. Como toda grande personalidade teve atitudes discutíveis como, por exemplo, ao autorizar a execução do Czar Nicolau II e toda a sua família durante o período do Terror Vermelho, execução essa que chocou o mundo inteiro.
Embora tivesse um bom casamento com Krupskaja (chegou a admitir certa vez que era um “casamento pequeno-burguês”), houve momentos de crise. Lênin teve um caso com a bela e culta militante socialista francesa Inês Armand durante seu exílio em Paris. A crise foi superada, mas, nesse aspecto, o homem comunista mostrou ser um homem como outro qualquer.
Tornou-se poderoso, mas não fazia ostentação. Segundo Arthur Conte, ao mudar-se para o Kremlin, Lênin “Escolheu um aposento antes ocupado por um serviçal. (...) Ele se instalara num escritório estritamente funcional, sem cortinas, desprovido do luxo característico dos que os capitalistas ocupavam. Trabalhava diante de um móvel rústico, lotado de documentos e dossiês, muitas vezes também empilhados numa simples poltrona de junco. A rudimentar decoração se completava com um singelo aquecedor a carvão, um pequeno cartão dos confins russo-turcos e, numa parede, o retrato de Marx. Ele proibiu que expusessem sua foto pelo Kremlin. Quando ia ao barbeiro para cortar os cabelos, jamais passava na frente de ninguém. Fazia questão de esperar sua vez. Durante o inverno rigoroso de 1917-1918, ficou sem aquecimento, como todos os moscovitas: “Não tem mais madeira. Eu também preciso fazer economia”. Ele sentia frio nos pés, mas não queria pele de urso - um simples feltro lhe bastava. Usava cotidianamente um de seus casacos mais velhos de emigrado”. [4] 

Lênin, um revolucionário para o século XXI

Mesmo seus mais ferrenhos adversários e críticos não negam que ele possuía uma enorme inteligência. Era um erudito, um estudioso sistemático e um analista extremamente metódico. Foi por meio de seus estudos e análises que afirmou em outra famosa frase: “Sem teoria revolucionária não há movimento revolucionário”. Em outras palavras, o pensamento ligado à ação. E foi essa ligação que fez com que a vitória obtida na Revolução se tornasse um triunfo completo.
Lênin pregava que era imprescindível que houvesse um partido forte, organizado e unido para obter o sucesso revolucionário. Talvez essas sejam algumas de suas maiores contribuições: sem organização, um objetivo claro traçado e união não se chega a lugar algum.
Outra grande contribuição foi a sua teoria política – que mais tarde recebeu a denominação de Leninismo – que combinava a teoria marxista do século XIX com a realidade do início do século XX. Lênin sabia que o Socialismo é uma ciência e, como tal, sempre está permanentemente a evoluir.
Provavelmente esse seja o grande erro da esquerda atual: ficar presa a velhos dogmas ao invés de fazer evoluir o Marxismo para a realidade deste início de século XXI, uma época de tecnologia digital na qual notebooks, celulares, tablets e internet dão o tom e reinam supremos. Lênin, aliás, era um entusiasta da tecnologia. Segundo Wells, Lênin apostava sua fichas em um esquema de desenvolvimento de grandes estações de energia na Rússia para atender todas as províncias com luz, transporte e energia industrial. (...) ele vê as decadentes ferrovias substituídas por um novo transporte elétrico, vê novas estradas se estendendo sobre o país, vê um novo e feliz comunismo industrial recomeçando.” [5]  Mesmo sendo uma pessoa realista, permitia-se a sonhar.
Lênin foi inevitável, quer as pessoas gostem ou não. Os estudos, atos e palavras, que levaram a uma ação transformadora, deste líder incomum são o seu legado para este mundo atual no qual, a cada dia, diante de uma opressão cada vez maior vinda das classes dominantes e donos do poder, surgem novos movimentos e novas manifestações na esperança de um mundo mais justo, mais igualitário e melhor.  


Publicado também no site do Centro de Mídia Independente (CMI).



Discurso de Lênin: O Que é o Poder Soviético?
(Original em Russo, com legendas em Português)






[1] Reed, John; Ten Days That Shook the World, London: Penguin (1977), p. 128
[2] http://socialistamorena.cartacapital.com.br/?s=entrevistas+hist%C3%B3ricas+h.g.+wells
[3] http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/lenin_-_o_revolucionario_discreto.html
[4] Idem.
[5] Ibidem.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Feliz 2014!



         Anteriormente, Panorama BR publicou um texto no qual analisou o ano que passou. Agora, faremos o contrário: em um exercício de futurologia, vamos, baseados em fatos ocorridos no ano anterior, tentar prever o que ocorrerá em 2014. É claro que corre-se o risco de errar – e feio – nas previsões, mas, quem já não tentou fazer isto antes? O tempo dirá onde acertamos e onde erramos.

Fuleco,o mascote da Copa do Mundo de 2014

          Para começar, o evento no qual milhões de brasileiros estarão simplesmente obcecados neste ano: a Copa do Mundo de Futebol. Depois de muitos anos, a competição retorna ao território sul-americano no local chamado de “país do futebol”, ou seja, nosso querido Brasil.
          Milhões de reais têm sidos gastos na organização e na construção de estádios – alguns dos quais ainda não estão prontos – o que foi um dos motivos das manifestações ocorridas em junho de 2013, que contestava esses mesmos gastos com um evento esportivo quando poderiam ser utilizados em saúde e educação (no “padrão FIFA”, ironizavam os manifestantes).
          Parece óbvio que haverão mais manifestações contra o Mundial até o final dessa competição. Figuras como Pelé disseram para deixar essas manifestações para lá e concentrar-se apenas na Copa, o que fez aumentar a antipatia contra o evento. De minha parte, penso que a Copa no Brasil irá ocorrer no pior momento possível para ela, pois será no mesmo ano das eleições gerais de nosso país. Da mesma forma, também é óbvio que, seja lá quem vença o pleito, irá usar e abusar do título em proveito próprio e de seu governo, tal como fez a ditadura militar após a vitória brasileira na Copa de 1970. Daí, vêm as perguntas que não querem calar: o Brasil vencerá a Copa? Será bom para o Brasil vencer a Copa? O Brasil deve vencer a Copa?

Urna eletrônica a ser usada nas eleições gerais de outubro deste ano
            As Eleições Gerais são o outro assunto que dominará as conversas em nosso país neste ano. Apesar de todas as manifestações ocorridas contra o governo, a presidente Dilma Rousseff permanece como favorita para a vitória nas urnas. Se as eleições fossem realizadas na data em que este texto é publicado, a atual presidente venceria com relativa facilidade, mesmo porque os outros candidatos, até o momento, não desperta entusiasmo no eleitorado, embora órgãos da chamada “grande mídia” apoiem nomes como o de Aécio Neves. E nomes da direita mais conservadora, tacanha e reacionária tal como o “pastor” Marco Feliciano, que teve grande destaque em 2013 graças ao seu período na Comissão de Direitos Humanos do Senado na qual comandou uma “cruzada anti-gay”, irão tentar a reeleição aproveitando-se da ingenuidade e ignorância de seus seguidores-eleitores para aumentarem ainda mais sua funesta influência. Ainda faltam cerca de 10 meses para o pleito, e as coisas podem mudar até lá, principalmente dependendo do resultado da Copa do Mundo de Futebol...

Bandeira da União Europeia (UE)

A crise financeira da Europa, que aparentava não ter fim, parece que finalmente dá sinais de recuperação, com uma ligeira subida de países como a Espanha, o fortalecimento do Euro perante o Dólar, a entrada da Letônia na Zona do Euro (grupo de países que utilizam a moeda única da União Europeia, a UE), e a criação de uma unificação bancária, que alguns analistas vêm como a salvação da lavora. Ainda assim, o Velho Continente – principalmente países como a própria Espanha, Portugal, Grécia, Itália, Irlanda e os recém-chegados Bulgária e Romênia – ainda passarão um ano muito difícil com a política de austeridade mantida pela “Troika” (grupo formado pela Comissão Europeia, Banco Central Europeu e o maldito Fundo Monetário Internacional, o FMI), que insiste no corte de salários e benefícios sociais que estão gerando desemprego e o aumento da pobreza nos países da UE. Novas e maiores manifestações são esperadas para acontecerem nos países-membros contra essa política, a “Troika” e os governos locais, vários deles com acusações de corrupção. E, além disso, há a queda de braço entre o governo da Ucrânia, que quer estreitar seus laços com a Rússia, e os manifestantes pró-europeus, que desejam entrar na União. A Grã-Bretanha, que faz parte da UE e não adotou o Euro como moeda, permanecendo com a Libra Esterlina, e que não sofreu tanto com a crise, olha com apreensão o referendo sobre a independência da Escócia, um desejo de milhares de escoceses, a ocorrer em setembro próximo. Se for aprovado pela população local, a relativa estabilidade britânica pode ser tremendamente afetada se isso ocorrer.


Edward Snowden

Um dos dois homens do ano (o outro é o Papa Francisco), o estadunidense Edward Snowden (assunto de um futuro artigo nosso), permanece em seu exílio russo fazendo ainda mais revelações sobre a espionagem protagonizada pelo seu país natal, os EUA, que o vem como um traidor, e, como peças de dominó armadas para cair quando empurradas, mais casos de espionagem de vários países – inclusive o Brasil – surgem a cada instante. Que outras revelações Mr. Snowden nos trará em 2014? O mundo aguarda curioso e preocupado...

Papa Francisco

O outro homem do ano, o Papa Francisco, conseguiu surpreender tanto seus simpatizantes como seus detratores. Com um forte discurso social, o que não era esperado pelos especialistas em Vaticano, Francisco tem aumentado sua popularidade e respeito tanto entre católicos como entre os não-católicos (que inclui os evangélicos). Sua ênfase aos pobres e desamparados e críticas ao sistema capitalista cruel e selvagem já lhe valeu, pelos conservadores e fascistas, a alcunha de “comunista” tanto fora como dentro da Igreja. Vamos ver em 2014 quem é verdadeiramente cristão nessa história...

Manifestação em São Paulo ocorrida em junho de 2013

Desde o ano passado para cá, vem aumentado muito o número de manifestações mundo afora. Países como Egito e Tailândia lutam contra governos opressores e corruptos. A corrupção também é um mal a ser combatido por países-membros da UE, conforme dito acima, assim como em países da África, Ásia e América Latina que, além disso, lutam contra a falta de liberdade política e de expressão (temas já analisados no artigo Lembrai, lembrai o cinco de novembro publicado aqui no mês retrasado). No Brasil, além das esperadas manifestações contra a Copa do Mundo, o Movimento Passe Livre (MPL), organizador de muitas dos protestos do ano passado, promete voltar à carga justamente para reivindicar aquilo que está em seu nome: o passe livre de ônibus e também de outras formas de transporte público. Como será que o governo irá reagir à estas manifestações em um ano de eleições gerais? Com certeza não será com açúcar e perfume...

Avião utilizado na Primeira Guerra Mundial 

Em 2014, vários acontecimentos passados serão lembrados e, alguns comemorados. Um deles é os 100 anos do início da Primeira Guerra Mundial, o primeiro conflito global ocorrido, com uso de armas até então novas (como, por exemplo, o avião) que acarretou milhões de mortes, a ponto de ter sido chamada de “a guerra para acabar com todas as guerras”. Infelizmente, como sabemos, não foi o que aconteceu.

Vladimir Lênin

Outro acontecimento a ser lembrado são os 90 anos da morte da Vladimir Lênin, o pai da Revolução Russa, que fez surgir o primeiro estado socialista do planeta: a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Figura carismática e controversa, o intelectual Lênin desperta paixões tanto a favor como contra a sua pessoa até hoje, mas ninguém nega a sua importância histórica e seu legado, apesar do fim da URSS e de outros países comunistas, permanece.

Ayrton Senna

Outra morte a ser lembrada, de modo particularmente triste pelos brasileiros, é a de Ayrton Senna, ocorrida 20 anos atrás. O fantástico tricampeão de Fórmula 1 deixa até hoje um vazio impossível de se preencher tanto nas pistas de corrida assim como fora delas. Sua paixão pelo que fazia, sua determinação (não raro beirando a obsessão), seu amor pelas crianças e pelo Brasil – algo cada vez mais raro hoje em dia – são exemplos que permanecem nos corações de todos.

Golpe Militar de 1964

Igualmente triste foi o golpe militar ocorrido em nosso país há 50 anos atrás, no malfadado ano de 1964. Sob a velha desculpa de “combater o comunismo”, os militares lançaram o país em um período de trevas que duraram mais de 20 longos anos.

Revolução dos Cravos de 1974

Em contrapartida, a Revolução dos Cravos, protagonizada pelos nossos irmãos portugueses há 40 anos atrás, em 25 de abril de 1974, tirou o país do longo período de trevas da ditadura salazarista, levando país a um período de democracia e liberdade sem precedentes que dura até hoje. Apesar da grave crise financeira que assola o país atualmente, Portugal tem muito a comemorar nessa data histórica.
Como podemos ver, este será um ano particularmente movimentado Da minha parte, espero que o bom senso e o bem maior prevaleçam neste ano que começa. Feliz 2014 a todos!

Como sempre, temos nossos fogos de artifício para saudar o novo ano: